quinta-feira, abril 12, 2007

A Europa numa Encruzilhada

O dia 25 de Março de 2007 marcou o 50º aniversário da assinatura do Tratado de Roma, que deu origem à Comunidade Económica Europeia – CECA e foi o embrião daquilo a que hoje chamamos de União Europeia.
Meio século depois do início da aventura europeia, a paz, a segurança e a prosperidade do velho continente são realidades inquestionáveis. Mas será que a União Europeia tem capacidade para mais 50 anos de sucessos, será que a Europa tem futuro?
As comemorações do Tratado de Roma ocorreram num ambiente de crise após o aparente falhanço do Tratado Constitucional, numa altura em que a unidade europeia é fortemente questionada.
O «Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa» foi o marco mais significativo para a união desde os últimos alargamentos, mas esbarrou redondamente em 2005 num estrondoso “não” gaulês e neerlandês.
Desde então a Europa tem vivido uma grave crise político-institucional, que tem paralisado os avanços da união e, quer queiramos, quer não, essa estagnação significa regressão, pois o comboio da globalização não parará por muito que nos questionemos sobre as suas causas e consequências.
A Europa atravessa assim uma grave crise de valores e de identidade sem precedentes, que se reflecte nos seus organismos e que nos leva necessariamente a um verdadeiro impasse em relação ao seu futuro.
É neste negro panorama que surge a Declaração de Berlim, como uma tentativa desesperada de revitalizar o espírito europeu.
A ideia da declaração partiu da chanceler alemã Angela Merkel, numa tentativa de unir os 27 estados-membros numa espécie acto «refundador» da Europa.
Isto com a esperança de criar um clima favorável ao relançamento da constituição europeia, que até ao momento já foi ratificada por 18 países membros, mas permanece numa espécie de “limbo” desde que foi rejeitada em 2005 pela França e Holanda.
A declaração de Berlim, pode ser assim entendida como uma espécie de “roteiro” para a retoma das negociações sobre a constituição europeia, dai que se fale de uma «renovação da base comum da União Europeia» e se estabeleça as eleições para o Parlamento Europeu em 2009 como o limite temporal para dotar a UE de uma base comum e renovada.
A Europa terá assim dois curtos anos para decidir o que quererá fazer com o tão badalado tratado constitucional e para definir o seu futuro.
Mas ao analisarmos o debate inerente à Declaração de Berlim, podemos antecipar que um hipotético tratado constitucional ainda estará muito longe.
Apesar dos esforços, os líderes europeus mostram-se fortemente divididos em relação ao que se deve manter da antiga proposta da constituição europeia, caso este seja realmente reformulado. A Alemanha e a Itália pretendem preservar grande parte da estrutura do tratado; a Holanda deseja que um hipotético novo tratado seja em conteúdo e alcance, muito diferente da proposta constitucional; por fim, a Polónia, a Inglaterra e a Républica Checa expressam a sua insatisfação contra a transferência de soberania dos governos para a união presentes no actual texto.
Uma das grandes limitações da Declaração de Berlim prende-se com o facto de não ter sida ratificada por os 27 estados-membros, pois foi apenas ratificada pelos presidentes das três instituições comunitárias: Angela Merkel representando o Conselho Europeu, Durão Barroso pela Comissão Europeia e Hans Gert Poettering pelo Parlamento Europeu.
Podemos então afirmar; que a Declaração de Berlim pode ter definido alguns princípios, valores, objectivos e metas para a união, mas a declaração não nasceu como um verdadeiro produto comunitário, representativa dos 27. Como tal até que ponto poderá ser vinculativa e cumprida pelos estados-membros?
Toda esta perspectiva poderá fazer nascer um euroceptismo, contudo não nos podemos esquecer que uma das qualidades intrínsecas do espírito europeu reside na persistência e na resiliência, isto é, a capacidade de recomeçar o caminho, mesmo depois do insucesso ou fracasso. É nesta capacidade de recomeçar o caminho que encontraremos as soluções para a crise politico-institucional europeia, e o futuro da Europa.
Uma solução para esta contingência terá irremediavelmente de passar por um consenso político, que devolva à Europa a possibilidade de construir um futuro comum a uma só voz, pondo de parte o marasmo a que temos assistido nos últimos tempos.
Como tal, a primeira solução para este impasse terá que passar obrigatoriamente pela aceitação geral do fracasso do «Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa», pois já uma vez a união teve que falhar para mais tarde avançar em 1952 com a Comunidade Europeia de Defesa – CED.
Outro ponto fundamental nesta solução, passa por reforçar os laços comuns dos europeus, entre eles, a integração e cooperação económica, pois só com uma Europa forte financeiramente é que poderemos pensar numa futura Europa politica.
A riqueza da Europa está na multiplicidade das suas culturas e, esta multiplicidade terá que ser uma solução e não uma ameaça para a construção europeia, pois sem ela a Europa, mais tarde ou mais cedo, se fragmentará.
Em termos institucionais teremos que reformular a pesada carga administrativa e burocrática que envolve as instituições europeias, teremos que tentar acabar com os Eurocratas, pois os cidadãos europeus não podem acreditar em instituições que não conheçam, e nunca apoiaram políticas distantes. Temos que fazer uma Europa mais perto dos cidadãos e sem burocracias.
A aproximação entre os cidadãos e as instituições europeias é então fundamental para que o projecto europeu chegue a um bom rumo.
Para isto, teremos que fomentar uma cidadania europeia cada vez mais forte e uma opinião pública cada vez mais informada, pois se os estados da Europa continuarem a insistir no afastamento dos povos das decisões da UE nunca sairemos da crise em que nos encontramos.
Um dos factores mais importantes numa solução frutífera para a Europa terá que passar inevitavelmente por a dificuldade de conciliar os alargamentos com o aprofundamento. Pois o sucesso da UE terá que passar cada vez mais, não por os constantes alargamentos, mas sim por um aprofundamento cada vez mais visível.
Teremos então de “reciclar” o método dos pequenos passos, pois só assim encontraremos uma solução viável para a União Europeia.
Como Robert Schuman prudentemente nos recorda: «A Europa não se fará de uma só vez, nem numa construção de conjunto; ela será feita através de realizações concretas, criando de início uma solidariedade de facto» [1].
[1] Robert Schuman, Pour Le Europe, préface de Jacques Delors, Genéve, Les Èditions Nagel, SA, 2000, p. 146.

Post By: Pedro Russo

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